De modo bastante abrangente, o termo
lipogênese pode ser empregado para se referir a toda e qualquer síntese de
lipídios, mas neste post vamos focar na síntese endógena de ácidos graxos, a
lipogênese de novo.
A
lipogênese de novo(LDN) se
caracteriza como uma via enzimática de conversão de carboidratos a gordura, o
que ajuda a explicar a relação entre a atual epidemia de obesidade e a adoção
de uma dieta hiperglicídica pela sociedade ocidental. Segundo um estudo do
Departamento de Ciências Nutricionais da Universidade de Berkeley, uma
substituição isocalórica de uma porção de lipídios por outra de
carboidratos por si só não é suficiente
pra induzir a LDN hepática, mas, quando o total de ingestão de carboidratos
ultrapassa as expensas totais de energia, o excedente pode ser convertido a
gordura para armazenamento, uma vez que lipídios são moléculas mais reduzidas
e, portanto, sua oxidação fornece mais energia.
Lipogênese como via metabólica
Em dietas
mistas normais, a lipogênese ocorre a taxas baixas (em geral, a massa de
palmitato formada endogenamente não chega a 5% da massa dos ácidos graxos da
dieta), pois os destinos metabólicos dos carboidratos são a produção de
glicogênio e a oxidação. Entretanto, no contexto de uma dieta tica em
carboidratos, a lipogênese passa a ser mais ativa. Em ambos os casos, o
processo metabólico que ocorre pode ser esquematizado em quatro etapas
(condensação, redução, desidratação, redução) e ser descrito da seguinte forma:
A LDN é
uma síntese redutora que tem como substrato imediato a Acetil-CoA e como coenzima empregada o NADPH. O Acetil-CoA é produzido na mitocôndria a partir do piruvato
por ação da piruvato desidrogenase (PDH). Como as enzimas da LDN são
citossólicas, o Acetil-CoA deve ser transportado ao citoplasma sob a forma de
citrato, que, posteriormente, é cindido por ação da citrato liase (com gasto de
ATP), liberando oxalacetato e Acetil-CoA.
A síntese
de ácidos graxos (como exemplo utilizaremos o ácido palmítico) ocorre a partir da
adição sucessiva de unidades de dois carbonos a um Acetil-CoA inicial. Essas
unidades de dois carbonos também provêm do Acetil-CoA, mas antes ele é
convertido a Malonil-CoA (3C) por ação da enzima Acetil-CoA carboxilase (ACC).
ACCà é uma ligase que contém Biotina
como grupo prostético e que catalisa a formação de Malonil-CoA a partis de
Acetil-CoA (com gasto de ATP). Está presente também em células que não fazem
lipogênese, e.g. miócitos, para atuar na regulação da beta-oxidação.
A segunda
enzima envolvida é, na verdade, um complexo multienzimático chamado Ácido graxo sintase(AGS) que desempenha
várias atividades catalíticas.
A síntese
do palmitato começa com a transferência de um resíduo acetil da acetil-CoA para
um grupo tiol de um resíduo de cisteína da AGS e com a transferência do resíduo
malonil da malonil-CoA para outro grupo tiol, o grupo tiol da 4’-fosfopanteteína.
Em seguida, há a transferência do resíduo acetil para o carbono dois do resíduo
malonil, com uma descarboxilação, formando aceto-acetil-enzima. Em seguida
ocorre a redução do aceto-acetil-enzima a D-hidroxi-acil-enzima, que então é
desidratado a ∆2 -enoil-enzima que é novamente reduzido a acil-enzima. Depois
da adição de mais uma unidade de dois carbonos ao acetil, o acil-enzima formado
será o butiril-enzima. Ciclos semelhantes ocorrem de modo que a cadeia aumenta
de dois em dois carbonos. Na fase de palmitil-enzima (C16) ocorre a hidrólise (tioesterase) e a libertação de palmitato
não esterificado.
Aspectos regulatórios
·
Insulina: A concentração desse hormônio
aumenta com o aumenta da glicemia, indicando que a carga energética está alta.
Assim, estimula o armazenamento por meio, por exemplo, da lipogênese. Esse
estímulo se dá por duas formas principais:
o
PDH: A insulina aumenta a desfosforilação dessa
enzima, tornando-a ativaà Aumento de Acetil-CoA
o
ACC: A insulina aumenta a desfosforilação
dessa enzima, tornando-a ativaà aumento de Malonil-CoA. Também é
ativa por excesso de citrato.
· Além desse mecanismo de controle por metabolismo de cardoidratos,
também há um mecanismo de regulação baseado na resposta aos níveis de esterois.
· Regulação da expressão gênica
Um estudo de
Towle e Postic revelou que o metabolismo de glicose, além da influência da
insulina, podem causar alterações na expressão gênica. Esse estudo mostrou que,
para dietas hiperglicídicas, há um estímulo da expressão gênica dos genes
da piruvato quinase hepática, ACC e AGS.
Esses genes são induzidos por fatores de transcrição ChREBP/Mlx através de
níveis de glicose no sangue alto e eventos de sinalização qoe ainda não foram
completamente desvendados. A indução mediada pela insulina atua na regulação
dos níveis de SREBP-1 c, também relacionado ao metabolismo do colesterol.
Uma vez que a LDN pode originar diversos ácidos graxos,
ela podem trazer ônus e bônus, conforme os efeitos desses ácidos graxos no
organismo.
O ácido palmítico, por exemplo, aumenta a produção de
citocinas pró-inflamatórias e de espécies reativas de oxigênio. Já outros
ácidos graxos, como o ômega-3 (origem exógena), possuem ações benéficas nos
sistemas imune e cardiovascular.
A LDN hepática possui efeitos deletérios, aumentando os
níveis séricos de triglicerídeos e os níveis de lipídios intra-hepáticos
(levando à esteatose). Ademais, altos níveis de DNL no fígado estão associados
à resistência à insulina.
De modo oposto, aumentos na expressão de enzimas
lipogênicas no tecido adiposo estão associados com aumento da sensibilidade à
insulina em humanos de modo independente da obesidade.
Referências
Hellerstein MK, De novo lipogenesis in humans: metabolic and
regulatory aspects.
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